O dia começou cedo. Pela janela do quarto transformado em escritório, arrecadação e, às vezes, mas raramente, quarto de visitas, via-se a claridade matinal a invadir o Céu, as nuvens claras a formarem-se e o Sol a tornar-se sublime. Acabava de sair da cama, de sobressalto, despertado pelo alarme invasivo do telemóvel. Era dia de reuniões. Mas no centro da cidade. Para quem vive e trabalha na zona sul de Luanda, deve ser sempre uma questão muito bem pensada reunir na Baixa de Luanda, e assim o tinha feito. Tratei do necessário antes de sair de casa e, logo de seguida, pus-me a correr pelas escadas, aproveitando a luz solar que penetrava pela varanda do edifício e me convidava para um dia produtivo.
A escassos metros de mim, ouvi uma buzina de um kupapata, ao qual respondi afirmativamente com um aceno de mãos e rumámos até a paragem de táxis, altamente movimentada, com passageiros a transparecer desespero pela ausência de candongueiros que estivessem a fazer corridas para o seu destino. Felizmente para mim, a oferta de serviços para o centro de Luanda era alta, embora em rotas encurtadas. Mas lá pus-me num “azul-e-branco” e saquei do telemóvel para consultar e responder a emails e espreitar as mensagens dos grupos de WhatsApp para saber se ao longo da noite alguma coisa de extraordinário tinha acontecido. É que não tinha sido a minha melhor noite em termos de produtividade, embora tivesse começado com uma reunião de trabalho da qual surgiu uma oportunidade de negócio e um parceiro ideal para dar resposta a um potencial cliente que me tinha sido encaminhado.
A celebração do acordo fez-me perder as horas e no dia seguinte estava a pagar pelo pouco tempo dormido. Esforçava-me para manter os olhos abertos e redobrava a atenção na resposta aos emails, quando numa das paragens subiram duas quitandeiras, bem-dispostas, carregando embrulhos enormes. Uma delas sentou-se mesmo junto a mim, suada, e poisou a trouxa no colo, pondo sobre a mesma uma bacia de plástico com um outro embrulho, porém menor.
“Sem kibuto não tem pão para os teus irmãos, meu filho”, disse, no final, ajustando ao máximo a trouxa para que eu não me sujasse. Percebendo a minha aflição, tão logo surgiu uma oportunidade, o cobrador do táxi arranjou um outro lugar para a senhora. Assistia-a a deslocar-se de um banco para o outro e percebi quão cuidadosa ela é com o seu “kibuto”, pois é dele que sai o seu sustento.
Entretanto, da trouxa maior trespassavam ramos de tubérculos e hortaliças que me atingiram o peito, causando-me um susto enorme, pois usava uma camisa branca e dentro de minutos teria duas reuniões. Se me tivessem tingido a camisa, estava, literalmente, tramado. Mas não, felizmente. Ainda assim, chamei atenção à quitandeira, com o respeito de quem é filho de quitandeira e foi educado com os lucros que provinham da venda de bolinhos, óleo de palma e outros produtos de época. A senhora, por sua vez, olhou-me e desculpou-se, mas disse que não tinha outra alternativa senão carregar o seu embrulho no colo. Ou seja, o carro não dispunha de um porta-bagagem. “Sem kibuto não tem pão para os teus irmãos, meu filho”, disse, no final, ajustando ao máximo a trouxa para que eu não me sujasse. Percebendo a minha aflição, tão logo surgiu uma oportunidade, o cobrador do táxi arranjou um outro lugar para a senhora. Assistia-a a deslocar-se de um banco para o outro e percebi quão cuidadosa ela é com o seu “kibuto”, pois é dele que sai o seu sustento. Voltei a atirar os olhos para o telemóvel, cuja carga estava no vermelho, e desliguei o saldo de dados para poupar energia. E perguntei-me: Que cuidado tenho com o meu produto? Trato dele tão cuidadosamente quanto essa quitandeira faz? Tenho noção que sem ele não terei pão à mesa? Até que ponto o meu “kibuto” é diferenciado? E satisfaz as necessidades dos meus clientes? É que, caso nenhuma das repostas seja afirmativa, então o meu “kibuto” não vale nada. Logo, não terei o que comer.
O dia começou cedo. Pela janela do quarto transformado em escritório, arrecadação e, às vezes, mas raramente, quarto de visitas, via-se a claridade matinal a invadir o Céu, as nuvens claras a formarem-se e o Sol a tornar-se sublime. Acabava de sair da cama, de sobressalto, despertado pelo alarme invasivo do telemóvel. Era dia de reuniões. Mas no centro da cidade. Para quem vive e trabalha na zona sul de Luanda, deve ser sempre uma questão muito bem pensada reunir na Baixa de Luanda, e assim o tinha feito. Tratei do necessário antes de sair de casa e, logo de seguida, pus-me a correr pelas escadas, aproveitando a luz solar que penetrava pela varanda do edifício e me convidava para um dia produtivo.
A escassos metros de mim, ouvi uma buzina de um kupapata, ao qual respondi afirmativamente com um aceno de mãos e rumámos até a paragem de táxis, altamente movimentada, com passageiros a transparecer desespero pela ausência de candongueiros que estivessem a fazer corridas para o seu destino. Felizmente para mim, a oferta de serviços para o centro de Luanda era alta, embora em rotas encurtadas. Mas lá pus-me num “azul-e-branco” e saquei do telemóvel para consultar e responder a emails e espreitar as mensagens dos grupos de WhatsApp para saber se ao longo da noite alguma coisa de extraordinário tinha acontecido. É que não tinha sido a minha melhor noite em termos de produtividade, embora tivesse começado com uma reunião de trabalho da qual surgiu uma oportunidade de negócio e um parceiro ideal para dar resposta a um potencial cliente que me tinha sido encaminhado.
A celebração do acordo fez-me perder as horas e no dia seguinte estava a pagar pelo pouco tempo dormido. Esforçava-me para manter os olhos abertos e redobrava a atenção na resposta aos emails, quando numa das paragens subiram duas quitandeiras, bem-dispostas, carregando embrulhos enormes. Uma delas sentou-se mesmo junto a mim, suada, e poisou a trouxa no colo, pondo sobre a mesma uma bacia de plástico com um outro embrulho, porém menor.
“Sem kibuto não tem pão para os teus irmãos, meu filho”, disse, no final, ajustando ao máximo a trouxa para que eu não me sujasse. Percebendo a minha aflição, tão logo surgiu uma oportunidade, o cobrador do táxi arranjou um outro lugar para a senhora. Assistia-a a deslocar-se de um banco para o outro e percebi quão cuidadosa ela é com o seu “kibuto”, pois é dele que sai o seu sustento.
Entretanto, da trouxa maior trespassavam ramos de tubérculos e hortaliças que me atingiram o peito, causando-me um susto enorme, pois usava uma camisa branca e dentro de minutos teria duas reuniões. Se me tivessem tingido a camisa, estava, literalmente, tramado. Mas não, felizmente. Ainda assim, chamei atenção à quitandeira, com o respeito de quem é filho de quitandeira e foi educado com os lucros que provinham da venda de bolinhos, óleo de palma e outros produtos de época. A senhora, por sua vez, olhou-me e desculpou-se, mas disse que não tinha outra alternativa senão carregar o seu embrulho no colo. Ou seja, o carro não dispunha de um porta-bagagem. “Sem kibuto não tem pão para os teus irmãos, meu filho”, disse, no final, ajustando ao máximo a trouxa para que eu não me sujasse. Percebendo a minha aflição, tão logo surgiu uma oportunidade, o cobrador do táxi arranjou um outro lugar para a senhora. Assistia-a a deslocar-se de um banco para o outro e percebi quão cuidadosa ela é com o seu “kibuto”, pois é dele que sai o seu sustento. Voltei a atirar os olhos para o telemóvel, cuja carga estava no vermelho, e desliguei o saldo de dados para poupar energia. E perguntei-me: Que cuidado tenho com o meu produto? Trato dele tão cuidadosamente quanto essa quitandeira faz? Tenho noção que sem ele não terei pão à mesa? Até que ponto o meu “kibuto” é diferenciado? E satisfaz as necessidades dos meus clientes? É que, caso nenhuma das repostas seja afirmativa, então o meu “kibuto” não vale nada. Logo, não terei o que comer.