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Gana substitui o inglês por idiomas locais como língua principal do ensino primário

Gana substitui o inglês por idiomas locais como língua principal do ensino primário
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O Governo do Gana anunciou que todos os professores passam agora a ser obrigados a utilizar os idiomas locais como principal meio de instrução no ensino básico.

O ministro da Educação, Haruna Iddrisu, apresentou a nova política na sexta-feira, 24 de Outubro, descrevendo-a como um passo decisivo para melhorar os resultados de aprendizagem e proteger a identidade cultural ganesa.

“A partir de hoje, o uso da língua materna no ensino é obrigatório em todas as escolas do Gana”, declarou o ministro.

A decisão desafia décadas de domínio do inglês no sistema educativo ganês e representa uma tentativa de reconectar o ensino à realidade cultural do país.

Por que razão o Gana está a fazer esta mudança

A ideia não é nova e conta com apoio internacional consolidado.

Estudos da UNESCO e do Banco Mundial demonstram que as crianças aprendem mais rapidamente e com maior confiança quando são ensinadas na sua língua materna, sobretudo nos primeiros anos de escolaridade.

Segundo o Governo, a medida tem também um valor simbólico e identitário. Após gerações de dependência do inglês, uma herança colonial, as autoridades afirmam ser tempo de reconectar a educação à cultura e às raízes linguísticas do país. A notícia foi destacada pelo portal Africanews.

Os desafios da implementação

O Gana é um país de enorme diversidade linguística, com mais de 70 línguas faladas e cerca de 11 oficialmente reconhecidas para fins educativos e de radiodifusão, incluindo akan (twi e fante), ewe, ga, dagbani, nzema e gonja.

Em regiões urbanas como Acra e Kumasi, a diversidade é ainda maior, o que torna difícil determinar uma “língua local dominante” por escola.

Outro desafio prende-se com os recursos disponíveis.

A maioria dos manuais escolares é escrita em inglês, e traduzir o material, formar professores e manter a coerência nacional exigirá tempo e investimento.

“Já temos dificuldade em obter materiais básicos em inglês”, disse Freda Serwaa, professora em Kumasi, à Africanews. “Agora precisaremos de livros e formação em dez línguas diferentes. É uma boa ideia, mas não estamos prontos.”

Uma política semelhante foi tentada no início dos anos 2000, mas acabou por fracassar devido à falta de apoio e resistência dos pais, que temiam um declínio na proficiência em inglês dos filhos.

A decisão do Gana insere-se num debate continental sobre o papel das línguas africanas na educação.

Países como a Tanzânia e a Etiópia há muito promovem o ensino na língua materna, com resultados mistos.

Na Tanzânia, o suaíli serve como língua unificadora, facilitando a política. Já em países mais linguística e culturalmente diversos, como Nigéria, Quénia e Camarões, a execução tem sido desigual.

Críticos argumentam que o ensino em línguas coloniais isola as crianças das suas realidades locais, enquanto outros alertam que abandonar o inglês demasiado cedo pode limitar o acesso dos alunos africanos a oportunidades globais.

“É um equilíbrio delicado”, afirma o professor Ernest Kissi, da Universidade de Ciência e Tecnologia Kwame Nkrumah. “Queremos preservar a identidade, mas sem ignorar as exigências da comunicação global.”

Para o Gana, trata-se de um experimento social e educativo.

Se for bem-sucedido, poderá inspirar reformas semelhantes noutros países africanos, provando que é possível construir um sistema educativo que reflicta a cultura sem perder a competitividade internacional.

Contudo, se falhar por falta de recursos, planeamento ou vontade política, corre o risco de se tornar apenas mais uma boa ideia que nunca saiu do papel.

Ainda assim, a decisão representa um gesto de confiança nacional.

O Gana, uma das democracias mais estáveis de África, dá um passo firme para redefinir a educação nos seus próprios termos.

O sucesso desta política dependerá de três pilares: formação adequada dos professores, disponibilidade de materiais didácticos e determinação política.

Se estes factores se alinharem, o país poderá estar a abrir caminho para um modelo educativo africano que finalmente fala com a sua própria voz.

6galeria

Veloso de Almeida

Repórter

Veloso estudou Comunicação Social no Instituto Superior Técnico de Angola (ISTA) e estagia como jornalista no portal ONgoma News.

O Governo do Gana anunciou que todos os professores passam agora a ser obrigados a utilizar os idiomas locais como principal meio de instrução no ensino básico.

O ministro da Educação, Haruna Iddrisu, apresentou a nova política na sexta-feira, 24 de Outubro, descrevendo-a como um passo decisivo para melhorar os resultados de aprendizagem e proteger a identidade cultural ganesa.

“A partir de hoje, o uso da língua materna no ensino é obrigatório em todas as escolas do Gana”, declarou o ministro.

A decisão desafia décadas de domínio do inglês no sistema educativo ganês e representa uma tentativa de reconectar o ensino à realidade cultural do país.

Por que razão o Gana está a fazer esta mudança

A ideia não é nova e conta com apoio internacional consolidado.

Estudos da UNESCO e do Banco Mundial demonstram que as crianças aprendem mais rapidamente e com maior confiança quando são ensinadas na sua língua materna, sobretudo nos primeiros anos de escolaridade.

Segundo o Governo, a medida tem também um valor simbólico e identitário. Após gerações de dependência do inglês, uma herança colonial, as autoridades afirmam ser tempo de reconectar a educação à cultura e às raízes linguísticas do país. A notícia foi destacada pelo portal Africanews.

Os desafios da implementação

O Gana é um país de enorme diversidade linguística, com mais de 70 línguas faladas e cerca de 11 oficialmente reconhecidas para fins educativos e de radiodifusão, incluindo akan (twi e fante), ewe, ga, dagbani, nzema e gonja.

Em regiões urbanas como Acra e Kumasi, a diversidade é ainda maior, o que torna difícil determinar uma “língua local dominante” por escola.

Outro desafio prende-se com os recursos disponíveis.

A maioria dos manuais escolares é escrita em inglês, e traduzir o material, formar professores e manter a coerência nacional exigirá tempo e investimento.

“Já temos dificuldade em obter materiais básicos em inglês”, disse Freda Serwaa, professora em Kumasi, à Africanews. “Agora precisaremos de livros e formação em dez línguas diferentes. É uma boa ideia, mas não estamos prontos.”

Uma política semelhante foi tentada no início dos anos 2000, mas acabou por fracassar devido à falta de apoio e resistência dos pais, que temiam um declínio na proficiência em inglês dos filhos.

A decisão do Gana insere-se num debate continental sobre o papel das línguas africanas na educação.

Países como a Tanzânia e a Etiópia há muito promovem o ensino na língua materna, com resultados mistos.

Na Tanzânia, o suaíli serve como língua unificadora, facilitando a política. Já em países mais linguística e culturalmente diversos, como Nigéria, Quénia e Camarões, a execução tem sido desigual.

Críticos argumentam que o ensino em línguas coloniais isola as crianças das suas realidades locais, enquanto outros alertam que abandonar o inglês demasiado cedo pode limitar o acesso dos alunos africanos a oportunidades globais.

“É um equilíbrio delicado”, afirma o professor Ernest Kissi, da Universidade de Ciência e Tecnologia Kwame Nkrumah. “Queremos preservar a identidade, mas sem ignorar as exigências da comunicação global.”

Para o Gana, trata-se de um experimento social e educativo.

Se for bem-sucedido, poderá inspirar reformas semelhantes noutros países africanos, provando que é possível construir um sistema educativo que reflicta a cultura sem perder a competitividade internacional.

Contudo, se falhar por falta de recursos, planeamento ou vontade política, corre o risco de se tornar apenas mais uma boa ideia que nunca saiu do papel.

Ainda assim, a decisão representa um gesto de confiança nacional.

O Gana, uma das democracias mais estáveis de África, dá um passo firme para redefinir a educação nos seus próprios termos.

O sucesso desta política dependerá de três pilares: formação adequada dos professores, disponibilidade de materiais didácticos e determinação política.

Se estes factores se alinharem, o país poderá estar a abrir caminho para um modelo educativo africano que finalmente fala com a sua própria voz.

Veloso de Almeida

Repórter

Veloso estudou Comunicação Social no Instituto Superior Técnico de Angola (ISTA) e estagia como jornalista no portal ONgoma News.

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